Mais um desabafo com um misto de história. Grande parcela de culpa por eu estar aqui hoje com um site falando de duplas diariamente é de Horia Tecau, aquele menino romeno de 22 anos com cara de perdido e que tinha um futuro brilhante pela frente. Havia acabado de entrar no top 300 de duplas, representava a Romênia pela Copa Davis ao lado do seu (até então) eterno parceiro Florin Mergea e estava ali, lutando para ser um top 100, quem sabe. Já o conhecia da boca de Victor Hanescu, que sempre falava de seus companheiros, mas a primeira vez que o vi foi justamente na Copa Davis, num confronto com a França em que ele e Florin saíram com uma vitória fantástica contra Clement/Llodra no 5º set. O tênis romeno sempre me fascinou por motivos idiotas, afinal eu amo o país e amo o esporte, por que não juntar as duas coisas? Isso já bastava.
Dali pra frente segui torcendo para os dois romenos, os jovens promissores que foram campeões de duplas em Wimbledon por duas vezes quando juvenis. Só que com Mergea a coisa não andou e muito menos durou, como vocês sabem. Eu participava de fóruns e comunidades de tênis romeno e era a única fã de Horia Tecau ali no meio. Mergea sempre foi mais popular pelo desempenho em simples no juvenil, já que foi número 2 do mundo e conquistou um título em Wimbledon, era a maior promessa do tênis romeno. Não sei o que tinham na cabeça, mas ou você torcia para Tecau, ou você torcia para Mergea. Decidi escolher o caminho do bem. (mentira) (não, é verdade mesmo, foi muito mais legal)
Horia, enquanto isso, seguiu melhorando e ganhando seu espaço no circuito. Em pouco tempo entrou no top 100. Em 2010, ganhou seu primeiro título. Mas alguma coisa parecia faltar, algo maior, um grande salto na carreira. Primeiro, Horia precisava de um parceiro que completasse seu estilo de jogo, que tivesse um ranking parecido e que fosse fixo, para que progredissem juntos. Após uma péssima gira latina ao lado de André Sá, incluindo a participação no finado torneio de Costa do Sauípe em que quase gerou o episódio ‘Aliny fugindo de casa para ver um tenista romeno aleatório’ que já devo ter contado por aqui, Lindstedt caiu no colo de Tecau (cabeçudos!) e a dupla disputou Miami, caindo na primeira rodada.
Nos seis torneios seguintes o romeno e o sueco conquistaram dois títulos, algo inusitado para uma dupla formada por dois caras que mal se conheciam. Dali foram para Wimbledon e de cara fizeram final, caindo em sets diretos para Melzer e Petzschner. Sorte de principiante? Os dois anos seguintes desmentiram, com Lindstedt e Tecau repetindo e chegando à final do Grand Slam britânico. Mas três vice-campeonatos doem. Três seguidos doem mais ainda. O destino parecia cruel para aquele menino que sonhava em levantar o troféu do principal torneio de tênis do mundo. Os três ‘quase título’ desgastaram a dupla e Tecau trocou de parceiro em 2013, fazendo um ano bem mais ou menos ao lado de Max Mirnyi.
Em 2014, então, Jean-Julien Rojer entrou em cena. O animado holandês, natural de Curaçao, veio ser os outros 50% do time. Habilidoso, com um físico impecável e de uma motivação incrível, Juls foi essencial para renovar e animar o romeno, que voltou a acreditar que podia sim ganhar um grand slam. A fresh start. Horia e Juls venceram oito torneios durante aquela temporada e se consolidaram como uma das grandes duplas, mas os resultados nos torneios de grande porte não saíram até o primeiro grand slam de 2015. Lá, a dupla emplacou e fez semifinal, repetindo o resultado em Roland Garros. Oras, estavam jogando bem e começaram a engrenar resultados nos torneios grandes, o que faltava? Faltava Wimbledon.
Wimbledon chegou e Tecau se sentiu em casa. Partidas dramáticas entraram no caminho da dupla, como contra Begemann/Knowle, em que o alemão e o austríaco tiveram o match point que poderia ter acabado com o sonho de Rojer e Tecau mais uma vez. Ou a partida contra Bopanna/Mergea, uma das maiores ameaças do circuito e que haviam eliminado os irmãos Bryan na rodada anterior. A memória das três finais poderia ter impedido. A inexperiência do parceiro em finais poderia ter impedido. A torcida totalmente britânica poderia ter impedido. Mas nada impediu. Nos momentos de dificuldade, Juls gritava o seu famoso ‘come on’, empurrando seu parceiro. Uma palavra de confiança, um tapa após um belo ponto ou um olhar. Um voleio certeiro, um forehand bem encaixado ou um winner de devolução. Tudo foi essencial para o momento de consagração.
Ver Romeo, pai de Horia, se emocionar ao ver seu filho levantar o troféu de Wimbledon foi tocante. Não só de felicidade, mas de alívio. A possibilidade de um quarto vice-campeonato em seis anos era assustadora. Se tivesse acontecido, qual seria a reação de Tecau? A frustração de um quarto ‘quase título’ doeria muito mais do que doeu antes. Randall, pai de Juls, também estava lá, abraçando os familiares e passando a mesma alegria de seu filho, mostrando em cada abraço o esforço e o trabalho duro que foram necessários para que Juls, que saiu sozinho e muito jovem de Curaçao, pudesse perseguir seu sonho.
A eterna jornada ao título de grand slam foi perfeita, parecendo até planejada. Os gêneros do filme da carreira de Tecau foram diversos até aqui: fantasia, suspense, drama, ação ou aventura, você escolhe. O desfecho de todos é o mesmo e o melhor de tudo isso ainda está por vir. Eu, uma mera espectadora nesses intensos nove anos, não poderia estar mais feliz. Aprendi muito com o Horia, que ouso dizer que me ajudou a construir meu caráter. Nele, não achei apenas um ídolo, mas também me permiti outra coisas. Aprendi um pouco da língua romena, conheci a cultura, ensaiei uma fuga adolescente e, acima de tudo, encontrei minha paixão pelas duplas. Ainda tenho muito a aprender, assim como ele ainda tem muitos capítulos para adicionar em sua história. A aventura só começou.
Estória emocionante!